segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

...Ana e seus vastos conflitos

"morrer de vez em quando
é a única coisa que me acalma" [Paulo Leminsk]
Ana se perdia em si mesma, mal se reconhecia. Quando criança, tinha as pernas repletas de cicatrizes escuras e grandes. Eram feridas que nasciam, se expandiam e depois morriam, gerando tantas outras, cuja explicação dada por sua mãe era: - Isso é herança da família em que veio, desse povo da roça de que você faz parte. Oh menina nojenta! Enquanto isso, as feridas nas pernas da sua irmã caçula eram vistas como alergia. No final das contas, aos dezessete anos descobrira que suas feridas também eram resultados de alergia. Quando Ana começou a sentir dores de cabeça e dificuldades para ler e ver o que estava escrito no quadro, em sala de aula, sua mãe dizia que a necessidade de querer usar óculos advinha do fato de querer imitar o irmão, que usava óculos desde pequeno. Resultado: foi ao oftalmologista e realmente precisava de óculos, pois tinha miopia e astigmatismo. Mesmo assim, até hoje [Ana com vinte e sete anos], sua mãe continua ressaltando a não-importância dela usar óculos. Aos doze anos, saía da escola com duas amigas e às vezes ia ao ponto de onibus com elas, já que este fazia parte do trajeto de casa. Um conhecido, marido da cabeleleira em que a mãe dela ia, dissera tê-la visto mexendo com homens (tais quais suas palavras). E sua mãe, sem a maior sombra de dúvidas, chegou em casa e bateu tanto em Ana... deixando marcas físicas e psicológicas, cujas agressões verbais chegaram ao "prostituta". Ana mal sabia o que era prostituta nem prostituição. Tempos depois descobriu, ao ler uma reportagem na revista Veja. Ingênua, palavra que a definia.
Quando terminou o ensino fundamental, sua mãe queria que ela entrasse no magistério por pensar que nunca conseguiria sair do ensino médio, achava que seria difícil demais para uma pessoa de mentalidade tão fraca. Ana não quis, matriculou-se no ensino médio e era uma das melhores alunas, inclusive em Geometria e Matemática [disciplinas que, no ensino fundamental, dera-lhe tanto trabalho]. Na 5ª série, período de revolta juvenil, Ana foi colocada em um curso particular. Não se importava, não sabia manipular sua vida e nem tinha estratégias para se projetar em um provável futuro. Então, seu professor das aulas particulares falara à sua mãe que ela não daria para nada que preste. E ela chorou tanto e quis tantas vezes que ele visse a sua competência nessas mesmas disciplinas que ele pouco sabia conduzir. O que importa é que ela conseguira se formar e passara em outro curso, está cursando uma especialização, tudo em uma universidade pública, e ainda acredita tornar-se independente, pois como a mãe dela mesma diz, Ana não manda em si mesmo... ainda não é gente.


Os seus conflitos se alongam no contínuo da vida.

Lu Rosário



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2 comentários:

Smareis disse...

Amando a história grande escritoa LÚ.
Volto pra ver esse final de Ana.
Bjs!

Smareis disse...

Corrigindo o errinho basico risos. "Escritora"

Beijos grande amiga!

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